Em algum lugar do "Microfísica do Poder"- coletânea de artigos de Michael Foucault, ele trata das relações de poder que vão além daquelas institucionais (do aparelho do estado: pátria, família, religião, escola ...)
Foucault desprende-se da ingenuidade dos marxistas que afirmavam haver oprimidos e opressores, sempre numa relação vertical de coação e com locais fixos dentro da pirâmide social.
"Dizendo poder, não quero significar 'o Poder', como conjunto de instituições e aparelhos garantidores da sujeição dos cidadãos em um estado determinado. Também não entendo poder como modo de sujeição que por oposição à violência, tenha a forma da regra."
"O poder está em toda a parte; não porque englobe tudo , mas porque provém de todos os lugares."
Não não, é mais complexa com certeza a questão: o poder (de reprimir ou de incitar) não existe em um só lugar e em uma direção apenas, "o que existe são práticas ou relações de poder" que ocorrem em "níveis variados e em pontos diferentes da rede social", "estados de poder instáveis".
Como Machado de Assis ilustrou no seu Brás Cubas através do episódio do negro Prudêncio, o oprimido torna-se o opressor de acordo com a sua possibilidade, ele passa adiante a violência da qual foi alvo, horizontalmente ou verticalmente.
"O poder se exerce a partir de inúmeros pontos e em meio a relações desiguais e móveis".
* Foucault - historia da sexualidade vol I.
Outro exemplo é a protagonista do engraçadíssimo e cruel filme "Bem vindo à casa de bonecas" de Todd Solondz, sofrendo todo tipo de perseguição na escola por ser feia e sem graça a menina tem um único amigo, um garoto estranho e afeminado. Num momento de fúria ela "desconta" as violências sofridas no coitado. Provavelmente - o filme não mostra- mas esse amigo iria passar prá frente o tratamento recebido...
Logo não existem algozes e vítimas e sim ambos num só indivíduo.
Quando somos um e quando somos o outro? Eis a questão...
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