segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

UM FILME SOBRE ALTERIDADE...

Quem não assistiu "O último jantar"
( The last supper)
que assista.


O filme é antigo, de 1995, a diretora Stacy Title
é, apesar de ter feito outros filmes, pouco conhecida... e tem a Cameron Diaz num dos seus primeiros papéis...prá quem interessar...

Enfim...passaria desapercebido, como uma obra discreta dentre tantas espalhafatosas... mas é uma obra de arte. Não há nada em demasia ou em falta... tudo está no seu devido lugar, e isso é uma boa condição prá se ter algo memorável...

No filme o mote é o seguinte: jovens intelectuais acadêmicos chamam pessoas de controversas posições políticas, religiosas e afins para um jantar - debate. Com isso eles esperam exercitar sua própria capacidade de argumentação, conseguindo refutar as colocações de seus convivas e convencendo-os de quão enganados eles estavam, assim "salvando-os" da iniquidade.

O problema é que muitas dessas crenças não estão pautadas no discurso liberal-racional- acadêmico, e a maioria dos convidados não parece muito disposta a abrir mão delas mesmo assim...

Que fazer então com seu conviva homofóbico, misógeno, extrema-direita?

Um desastre indica o caminho... a discussão sai do âmbito das idéias e passa a agressão física... na briga um dos visitantes é ferido e morre.
A partir daí os amigos passam a chamar toda a semana uma persona non-grata para um enfrentamento de idéias...porém se a pessoa não se convencer de sua posição equivocada, ela ganha o direito a brindar com um vinho especial...com alta concentração de arsênico.

O filme é inteligente do início ao fim.

Os amigos liberais, politicamente-corretos, formalmente educados, dão um show de... INTOLERÂNCIA...ao mandar prá baixo da terra os "futuros Hitler", os "futuros Stalin", e assim por diante...
Nada dá errado nos planos dos moços salvadores-do-planeta... cheios de boas-intenções eles continuam fazendo sua "limpeza ideológica" e aumentando o adubo de seu jardim e de sua plantação de tomates que cada dia se torna mais exuberante...

Mas o problema é que a intolerância começa a ser tamanha que começa a estremecer os laços de amizade entre moderados e exaltados, eles passam a mal se suportar uns aos outros e no fim no meio à duvidas e culpa a não suportar nem a sí próprios.

Os poderes de conceder ou não a vida à alguém mexem com a cabeça dos moços, esse "pode tudo" leva suas crenças morais à derrocada, vaidade, culpa e descontrole se instalam em medidas diferentes em cada um deles, transformando-os em sombras do que um dia poderiam ter sido...em cinzas dos heróis que desejavam ser...

É muito interessante...vê-los cedendo ao mal pela primeira vez...e acompanhar essa erva daninha se instalando e rompendo as paredes da casa interna de cada um e da casa externa na qual vivem todos eles...

Parece assustador não é? Seria...se o filme não fosse em tom de fino humor-negro, o que torna o trabalho da diretora algo mais memorável ainda, nada de cenas deprimentes, nada de sangue, nada de existencialismos... tudo muito leve, mas um leve que gruda na cabeça da gente e fica semanas rodando sem parar...

Ah, será que você tinha noção real do que queria dizer alteridade antes de assistir esse filme?

domingo, 11 de dezembro de 2011

ESPIRITUALIDADE

Ninguém melhor do que Foucault prá definir espiritualidade:


"Poderíamos chamar de ESPIRITUALIDADE o conjunto de buscas, práticas e experiências tais como as purificações, as asceses, as renúncias, as conversões do olhar, as modificações de existência, etc., que constituem [...] para o sujeito [...] o preço a pagar para ter acesso à verdade."

"A espiritualidade postula que a verdade jamais é dada de pleno direito ao sujeito."

"A espiritualidade postula que o sujeito enquanto tal não tem direito, não possui capacidade de ter acesso à verdade."

"Postula que a verdade jamais é dada ao sujeito por um simples ato de conhecimento, ato que seria fundamentado e legitimado por ser ele o sujeito e por ter tal e qual estrutura de sujeito."

"Postula a necessidade de que o sujeito se modifique, se transforme, se desloque, torne-se, em certa medida e até certo ponto, outro que não ele mesmo, para ter direito ao acesso à verdade."

"A verdade só é dada ao sujeito a um preço que põe em jogo o ser mesmo do sujeito. Pois tal como ele é, não é capaz de verdade."

"[...] Desse ponto de vista não pode haver verdade sem uma conversão ou sem uma transformação do sujeito."

"A espiritualidade postula que quando efetivamente aberto, o acesso à verdade produz efeitos que seguramente são consequência do procedimento espiritual realizado para atingi-la, mas ao mesmo tempo são outra coisa e bem mais [...]"

"Para a espiritualidade, a verdade não é simplesmente o que é dado ao sujeito a fim de recompensá-lo, de algum modo, pelo ato de conhecimento e a fim de preencher esse ato de conhecimento."

"A VERDADE É O QUE ILUMINA O SUJEITO; A VERDADE É O QUE LHE DÁ BEATITUDE; A VERDADE É O QUE LHE DÁ TRANQUILIDADE DE ALMA."

"Em suma, na verdade e no acesso à verdade, há alguma coisa que completa o próprio sujeito, que completa o ser mesmo do sujeito e que o transfigura."


"Resumindo: para a espiritualidade, um ato de conhecimento, em sí mesmo e por sí mesmo, jamais conseguiria dar acesso à verdade se não fosse preparado, acompanhado, duplicado, consumado por certa transformação do sujeito, não do indivíduo, mas do próprio sujeito no seu ser de sujeito."