sábado, 2 de abril de 2011

A DISTRAÇÃO E OS CRIMES MORAIS

Hannah Arendt tem um livro que considero primoroso "Responsabilidade e Julgamento"- nele ela destrincha (exatamente este termo) as cabeludíssimas questões morais que assombram boa parte da humanidade.

Para ela, o homem não é apenas um, mas dois coexistindo no mesmo corpo, há aquele que age e há aquele que, de dentro, vê e julga:

"Falo comigo mesmo[...] e embora eu seja um só, sou dois-em-um, e pode haver harmonia ou desarmonia com o eu."

"Se discordo de outras pessoas posso me afastar; mas não posso me afastar de mim mesmo, portanto, é melhor que eu primeiro tente estar de acordo comigo mesmo antes de levar todos os outros em consideração."

* Essa é a grande questão, não há como fugir de sí mesmo, não há como partir a cabeça, tirar a consciência ou o "grilo-falante" e guardá-lo em um pote no fundo de um armário.

"Assim como sou meu parceiro quando estou pensando, sou minha própria testemunha quando estou agindo. Conheço o agente e estou condenado a viver junto com ele. E ele não é calado."

"Se estou em desavença com meu eu, é como se eu fosse forçada a viver e interagir diariamente com meu próprio inimigo."

"Se pratico o mal, vivo junto com um malfeitor [...] e ninguém vai preferir viver junto com um ladrão, um assassino ou um mentiroso."

* Logo podemos deduzir que a vida, quando não há uma concórdia entre essas duas pessoas que habitam um mesmo corpo, se torna um inferno.

Hannah afirma ainda que é este diálogo interno silencioso que nos distingue dos animais.
É a linguagem sim, mas usada de uma forma reflexiva
, afinal os animais se comunicam entre eles de alfguma forma- não verbal...

Segundo ela a única forma de fugir do conflito entre o eu que age e o eu que observa ao se cometer um crime moral é esquecer que o se cometeu.
E como se esquece? Através de uma constante distração...
Distraídos é assim que podemos chamar os moralmente inconsistentes...
Eu ferí por distração... eu me apropriei do alheio sem me aperceber... eu cometí um crime por acaso... sem intenção de...

Sem intenção maldosa e sem prestar muita atenção aos delitos que vão cometendo esses indivíduos dúbios vão caminhando e deixando às suas costas uma terra arrasada, exaurida, desolada...e tudo isso justificado por -apenas- DISTRAÇÃO.

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