terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O TRABALHO DE SÍ

...dando continuação ao post "ESPIRITUALIDADE" :

Foucault afirma que outra forma de "busca da verdade" dentro da história do homem seria
O CUIDADO DE SÍ, entendido como conhecimento de sí, como elaboração de sí para consigo.
Esse cuidado de sí, esse "ocupar-se consigo mesmo", assim como a espiritualidade é o que torna o sujeito "capaz de verdade", no sentido de "apto à verdade". Ele é um momento introspectivo, solitário, contudo, não-individualista, uma vez que todo crescimento e todas as relações interpessoais dependem do conhecimento de sí.

"É preciso ocupar-se com a própria alma."
"Sócrates diz que incita seus concidadãos de Atenas [...] a se ocuparem com sua alma (psykhé) a fim de que ela se torne a melhor possível."

" É sendo sujeito [...] que se deve estar atento a sí mesmo. Trata-se pois de ocupar-se consigo mesmo enquanto se é sujeito da khrêsis (com toda a polissemia da palavra: sujeito de ações, de comportamentos, de relações, de atitudes). A alma como sujeito e de modo algum como substância".

"Durante todo o pensamento antigo de que lhes falo [...] ocupar-se consigo mesmo tem sempre um sentido positivo, jamais negativo."

Ele afirma que em todas as civilizações é manifestada a idéia de "pôr em exercício uma tecnologia de sí para ter acesso à verdade", essa tecnologia consiste em práticas, como:
- A purificação através de rituais.
"[..] escutar música, respirar perfumes, praticar o exame de consciência."
- A concentração da alma:
"A alma é algo de móvel. A alma, o sopro é algo que pode ser agitado, atingível pelo exterior.[...] é preciso evitar que a alma [...] se disperse.É preciso evitar que se exponha ao perigo exterior, que alguma coisa ou alguém do exterior o atinja".
- O retiro:
"É uma certa maneira de desligar-se, de ausentar-se - ausentar-se mas sem sair do lugar - cortar de certo modo o contato com o mundo exterior, não mais sentir as sensações, não mais agitar-se com tudo que se passa em torno de sí".
- A prática da resistência:
" suportar as provações dolorosas e difíceis, ou ainda, resistir as tentaçnoes que possam advir."

"É para conhecer-se a sí mesmo que é preciso dobrar-se sobre sí.
É para conhecer-se a sí mesmo que é preciso desligar-se das sensações que nos iludem.
É para conhecer-se a sí mesmo que é preciso estabelecer a alma em uma fixidez imóvel que a desvincula de todos os acontecimentos exteriores.
É ao mesmo tempo, para conhecer-se a sí mesmo e na medida em que se conhece a sí mesmo que tudo isso deve e pode ser feito."

Foucault observa que até o momento de produção do texto que analisa inicialmente - Alcibíades de Platão - o cuidado de sí aparecia como algo "necessário em um dado momento da existência e em uma ocasião precisa". No caso, no momento em que o jovem aristocrata passava para a idade adulta a fim de prepará-lo para desempenhar as funções esperadas dele dentro do meio social. Porém, há o que ele chama de "uma explosão do cuidado de sí", ou uma generalização dos sujeitos que deveriam "se trabalhar", generalização que é feita em dois eixos: não apenas o aristocrata e aqueles que detém o poder, mas todos os indivíduos. E não apenas na transição da juventude para a vida adulta, mas em todos os momentos da vida.

O cuidado de sí torna-se coextensivo à vida, e há a assimilação entre "filosofar" e "ter cuidados com a própria alma":

"Quando se é jovem não se deve hesitar em filosofar e, quando se é velho, não se deve deixar de filosofar. Nunca é demasiado cedo nem demasiado tarde para se ter cuidados com a própria alma. Quem disser que não é ainda, e já não é tempo de filosofar assemelha-se a quem diz que não é ainda ou já não é tempo de alcançar a felicidade." (Epicuro - carta à Meneceu)



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